"The best moments in reading are when you come across something – a thought, a feeling, a way of looking at things – that you’d thought special, particular to you. And here it is, set down by someone else, a person you’ve never met, maybe even someone long dead. And it’s as if a hand has come out, and taken yours.”
Alan
Bennett, The History Boys
Conforme o primeiro texto publicado aqui neste espaço buscou expressar, a criação do Resquícios Analógicos se deu como uma tentativa de, através da escrita, lidar com diversos problemas, inquietações e reflexões que habitam, e por vezes sobrecarregam, a minha mente. Assim, conforme o subtítulo do blog afirma, se trataria de “Um recanto, um refúgio, uma forma de escape, mas também de enfrentamento”, um lugar para despejar tudo aquilo que eu gostaria de dizer, sobre os mais diversos temas que me interessam, sempre a partir de reflexões pessoais.
Em suma, mais do que escrever para os outros, o objetivo era escrever para mim mesmo, quase que de forma terapêutica. Um desafio, é claro, ainda mais ao se considerar que minha relação com a escrita é algo muito pessoal: escrever sempre é depositar uma parte de mim no pedaço de papel (ou na página da internet), é se expor e, portanto, tornar-se de alguma forma vulnerável, algo que eu não lido nada bem. No entanto, mesmo com tudo isso, decidir avançar com o projeto por conta de um misto de entusiasmo, necessidade e circunstância (início da pandemia e isolamento), pois adoro escrever e realmente precisava colocar muita coisa para fora, do meu jeito. Tratava-se, portanto, de unir o útil ao agradável, o necessário a algo que genuinamente me alegra.
E confesso, sem falsa modéstia, que considerei um bom início, do qual me orgulhei, pois publiquei o escrito inicial e logo em seguida, sem grandes demoras, uma resenha sobre a obra Solitário, de Chabouté. Ambos foram, em suas essências, textos nos quais discorri, da forma mais aberta que pude, sobre alguns problemas e inquietações que tenho: por um lado, no primeiro texto, a necessidade, o desafio e a dificuldade de se escrever; por outro, no segundo, a questão da solidão auto infligida como simultaneamente uma forma de se proteger, mas que inadvertidamente faz com que você se torne prisioneiro de si, ao erguer muros que deixam de ser uma fortaleza e se tornam uma prisão no qual você é o próprio carcereiro.
E assim se iniciou o meu projeto de escrita. Cá estamos, literalmente um ano depois (o primeiro texto foi publicado em março de 2020), e as coisas não saíram exatamente como planejado. O projeto não deslanchou como gostaria, não consegui engrenar na escrita e publicação dos textos. Por que isso ocorreu? Perdi a vontade e disposição, acabou o interesse e a necessidade de escrever? Nem um pouco, ainda é algo que gosto muito de fazer e que serve, da minha própria maneira, como desabafo. Esgotaram-se as ideias sobre o que se escrever? Não, tenho várias, todas anotadas em um pequeno caderno amarelo, páginas e mais páginas de temas e tópicos que gostaria de explorar, algumas ideias com cinco anos de idade sem saírem do papel. Fiquei sem tempo? O tempo é escasso por definição, nosso recurso mais precioso e ao mesmo tempo aquele que tratamos de forma mais banal, mas sempre é possível encontrar tempo quando se quer. Então, o que aconteceu?
Na verdade, foram várias coisas. O início da pandemia e o começo do isolamento social foram responsáveis por criar um senso de inquietação, agravar ansiedades e tensões, e gerar uma mudança maior e mais intensa do que eu (e eu creio que todos nós) antecipei. Então, por um lado, houve o “fator pandemia”. Ao mesmo tempo, houve um problema que eu mesmo criei para mim: prazo. Animado pelo início do projeto, coloquei uma escala de produção e publicação de textos semanal no blog, acreditando que isso seria um bom motivador para manter a elaboração dos textos. Ledo engano, jovem padawan.
Considerando o meu método de escrita de textos, um tanto quanto perfeccionista e sempre voltando para consultar o material sobre o qual eu estou escrevendo (ou seja, reler o livro/HQ, rever o filme/série sobre o qual se pretende escrever), tal meta de publicação semanal teve justamente o efeito contrário: transformou aquilo que deveria ser uma forma positiva de lidar com ansiedades e inquietações, um tipo de lazer e desabafo, em uma obrigação, a ideia de que eu preciso ler muito, ver muita coisa para conseguir escrever semanalmente sobre o que me interessa. E com isso, ao se tornar uma obrigação, veio também uma situação de se sentir pressionado. Pressionado por quem, você pode estar se perguntando. Ora, pelo meu mais ávido e cruel crítico: eu mesmo. E, assim, o projeto que nasceu como algo positivo acabou se tornando indevidamente mais um dever a ser incluído em uma já grande fila de obrigações, gerando um sentimento de desconforto e pressão, o que fez com que eu o deixasse de lado.
Até hoje, quando esse projeto finalmente volta, mas agora um tanto quanto diferente, tanto no que diz respeito às suas motivações, quanto à sua estrutura e formato. Em primeiro lugar, sobre as motivações, escrever permanece sendo para mim uma questão de necessidade e utilidade, isto é, algo que me traz uma alegria e paz de espíritos genuínas ao mesmo tempo em que me auxilia a lidar com diversas questões pessoais, as quais sempre estão invariavelmente inseridas e refletidas nos textos que eu escrevo, nos comentários que eu faço e nas reflexões que eu tenho. Sendo assim, eu preciso, mais do que nunca, escrever.
Ao mesmo tempo, ainda sobre as motivações por detrás do retorno desse projeto, existe agora um novo fator, igualmente importante: talvez outras pessoas apreciem essa escrita, talvez algo da leitura dos meus textos ressoe com elas, cause uma identificação, transmita uma sensação de acolhimento e recepção, a compreensão de que outras pessoas passam por problemas semelhantes e tentam lidar com eles como podem, a ideia de que não se está sozinho nisso tudo. E isso é muito, muito importante para mim, porque em diversos momentos da minha vida, minha “companhia”, meu senso de reconhecimento e pertencimento foi proveniente da literatura, dos textos e livros que eu li, de Stephen King a Dostoievski e tudo o que há no meio. E assim, talvez o que eu escreva agora possa produzir um efeito semelhante em alguém que leia.
Essa pequena epifania foi gradativamente tomando forma e se instaurando na minha cabeça ao longo deste último ano, difícil e cheio de atribulações, a partir dos comentários de algumas pessoas, dentre essas alguns alunos e alunas que tive, sobre como meus textos os auxiliaram de alguma forma, sendo gerando uma sensação de reconhecimento ao se identificar com algo do que foi escrito, seja mesmo como motivação e estímulo para que fizessem o mesmo e se aventurassem nessa jornada que é escrever. Foi essa compreensão, a ideia de que talvez, de alguma forma, o que eu escrevo possa ajudar, mesmo que um pouco, outras pessoas além de mim, que foi responsável por dar o empurrão final necessário para que esse projeto voltasse a funcionar. E aqui está ele, de volta.
Quanto à estrutura e formato, é necessário aprender com os erros do passado. Assim, desde logo se abandona aqui qualquer pretensão de publicações semanais por calendário determinado. Trata-se então de escrever e publicar quando se tiver vontade e disponibilidade, revisitando os livros/filmes/HQs/séries com calma e tranquilidade, conforme as coisas forem se desenvolvendo naturalmente, para que eu possa escrever de um jeito que me agrade, tanto em termos de qualidade de escrita quanto no que diz respeito à própria experiência de escrever. Assim, uma mudança de formato significativa: as publicações, quando houverem, serão sempre feitas nas sextas à tarde, porém sem qualquer obrigação de produtividade. Outra mudança nesse tocante diz respeito ao Instagram do Resquícios Analógicos: pretendo torna-lo mais ativo, com mais publicações mais simples como imagens, trechos de livros e, em especial, recomendações de livros/filmes/séries/HQ’s e tudo o mais que se possa imaginar, mantendo, é claro, a ideia de não se pressionar para fazer isso.
Sendo assim, renovo aqui o convite que foi feito no texto inaugural desse pequeno projeto chamado Resquícios Analógicos: você é, agora mais do que nunca, muito bem-vindo (a) para acompanha-lo, tanto o Blog quanto o Instagram. E, mais importante ainda, muito bem-vindo (a) para interagir com esse projeto, na forma que lhe mais apetecer, seja comentando e discutindo os textos publicados ou apenas seguindo e lendo essa pequena empreitada. Talvez, apenas talvez, você encontre algo que lhe gere interesse e entretenha, algo que lhe agrade e apeteça, e até mesmo, se eu puder ser esperançoso o suficiente, algo que ressoe com você e como você se sente, que lhe gera um sentimento de identificação e que, mesmo que por pouco, lhe ajude de alguma forma. Isso, confesso, certamente me faria bastante feliz.
Então, sem mais delongas, sem bem-vindos de volta ao Resquícios Analógicos, Caro(a) Leitor(a). E juntos seguimos nessa jornada.
https://www.instagram.com/resquiciosanalogicos/
Que alegria é saber que o Resquícios está de volta!
ResponderExcluirMamma Mia, here I go again
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